Friday, January 8, 2010

Cheiro a cão com sono

Acho que hoje consegui eleger, de entre todos os cheiros que guardo na memória (aquela poderosa, crua e instintiva como só uma porção tão primitiva do cérebro pode guardar), qual o meu preferido.

É o cheiro a cão com sono.

Não sei explicar como, mas os cães têm um cheiro diferente quando estão com sono. Nos humanos o cheiro do suor muda consoante as circunstâncias e as diferentes moléculas correm por nós adentro. Mas, do pouco que sei de fisiologia canina (ou seja, senso comum), os cães só transpiram pela lígua. E as minhas cadelas quando dormem fazem-no de língua fechada. Bem... há vezes em que o sonho ladra mais forte e elas mexem-se como se o R.E.M. não estivesse a marcar as suas posições. Mas normalmente a sua transpiração está guardada entre os dentes.

Então porquê? Porquê a diferença entre cão sonolento e não sonolento?

Não sei. Só sei o que me diz o meu nariz - é diferente. É um cheiro que me traz conforto e ternura. Lembra-me as noites em que me estava a perder num qualquer zapping desinteressante e vinha ela, pata ante pata, sem toda a energia diurna e cambaleando, pedir-me festas de dorso no chão. Até o pêlo de rafeira parecia estar mais macio... E ficava com ela no colo até estar cheia de todo e tédio do mundo e a voltar a deitar no corredor. Ou de, não muito secretamente, a levar comigo para a cama para que adormecer fosse tão mais fácil.

Agora, mudou o pêlo, cor de mel, mudou o suor, mudou a rafeira. O cheiro mantém-se. O conforto mantém-se. A ternura que inspira um pequeno animal rendido ao mimo é constante. E apesar da ternura, é irresistível mexer e acordar, moldar. Pelo menos até ouvir um longo suspiro, misto de reclamação e resignação. O sorriso não se contém.

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